Dieta Mediterrânea ajuda pacientes cardíacos a controlarem colesterol
A mais saudável de todas as dietas está ajudando os cardíacos do Brasil. Pesquisadores confirmam os benefícios do azeite, do vinho, do peixe, das ervas e dos grãos.
O representante de vendas José Edson Medeiros de Oliveira e o corretor de imóveis João Amadeu Rossi Formica nem se conhecem, mas os dois já passaram pela mesma experiência. “Senti uma sensação estranha aqui no peito, como se tivesse tomado um líquido, e esse liquido tivesse entrado com dificuldade. É como se você estivesse entalado”, conta o representante de vendas.
Edson estava no meio da rua. João, na sala com a família. “De repente, eu derreti. Ela dizia: ‘nós temos que ir para o hospital’. Eu falei: ‘não, vamos em uma farmácia, isso é onda’”, lembra o corretor de imóveis.
saiba mais
“Então, ele não quis ir para o hospital. Eu tive que brigar, os filhos levantaram, ficaram todos nervosos. E aí a gente carregou literalmente”, conta a professora Vera Maria Formica.
Os números impressionam. Assim como Edson e João, cerca de 200 brasileiros são internados diariamente tendo um infarto. João recebeu duas pontes de safena e uma mamária no coração. Edson colocou um stent - um pequeno tubo que, depois de inserido na artéria entupida, é expandido, para que o sangue volte a correr.
O inesperado havia acontecido. A partir daí, a vida que levavam antes do infarto ficou só na lembrança. “Muita carne, muita picanha nos churrascos, linguiça”, cita Edson. “Meu filho deixava a gordura do lado, eu ia lá e pegava. Ele ficava brabo comigo. Eu adorava (a gordura da carne), a sua e a dos seus filhos”, revela João.
Parece que problema no coração, depois de certa idade, é um fantasma, que faz parte da vida de todo mundo. É impressionante como as doenças cardiovasculares ainda são as que mais matam no Brasil e em vários países do mundo. E os repórteres Hélter Duarte e Graziela Azevedo tiveram contato com muita gente que teve problema, mas que, felizmente, conseguiu sobreviver e pode contar a história para nós.
Depois de enfrentar um baque desse, você tem que mudar a alimentação. Não tem como escapar. Não tem saída, é dieta para a vida inteira. E eles sofrem com a dieta, porque tem muita restrição. É preciso dar adeus às guloseimas.
“Eu saí do hospital com uma dieta bem rígida e levei essa dieta por um ano e até mais. E não tinha graça, era uma comida insossa”, declara Edson. “Você tem que aceitar e tem que mudar mesmo”, afirma João.
Mas um ano depois de enfartar, Edson recebeu no Instituto do Coração (InCor) um convite tentador, que mudaria a vida dele: participar de uma pesquisa sobre alimentação. Foram 39 voluntários vítimas de infartos e anginas. Como a ideia era testar duas opções de dieta, metade dos voluntários seguiu a tradicional para quem tem problemas do coração, e metade seguiu a Dieta do Mediterrâneo.
“Nas populações que têm esse hábito mediterrâneo, eles têm uma alta expectativa de vida e menores índices de doenças cardiovasculares”, aponta a nutricionista Maria Cristina Thomazella.
Italianos e gregos, que vivem às margens do Mediterrâneo, gostam muito desse jeito saudável de comer. Será que brasileiros de coração doente iriam gostar da dieta e melhorar com ela?
“Os alimentos típicos desse padrão mediterrâneo, que foi associado à saúde, são: abundância de alimentos de origem vegetal, ou seja, hortaliças em geral, que inclui: os legumes variados e sazonais (legumes da época), verduras, que estão dentro do grupo das hortaliças, também variadas e frutas em geral”, declara a nutricionista. “As frutas, por exemplo, a orientação era de no mínimo quatro a seis porções diárias. As hortaliças, no mínimo, quatro porções diárias, como verduras e legumes”.
A repórter Graziela Azevedo acompanhou José Edson Medeiros de Oliveira em uma refeição e descobriu que o representante de vendas segue tudo à risca. Ele faz cinco refeições por dia. No lanchinho da manhã, ele come uma ameixa preta, uma avelã, uma castanha do Pará, meia noz, uma porção de uvas passas e uma fruta. À tarde e nas sobremesas, ele vai variando as frutas.
Desde que sofreu o infarto, Edson passou a trabalhar em casa com os filhos. Enquanto eles estão lá, na cozinha, o almoço já está em andamento.
A psicóloga Carmem Medeiros de Oliveira mostra para a repórter Graziela Azevedo o que prepara para o almoço. “É um peixe branco. O tempero vai mais, mas não tem sal. Eu coloquei limão, para substituir o sal, pimenta do reino, orégano, e tem também um pouco de páprica, pimentão, cebola, tomate”.
Carmem aprendeu a usar azeite, ervas, dar preferência aos alimentos integrais e fazer muito peixe. Reduzir bem o consumo de carne pode ser difícil no começo, porque os brasileiros exageram.
A pesquisadora levou um susto quando fez as contas. “Eles consumiam, em média, 400 gramas de carne vermelha diariamente. É muita coisa, são quatro bifes. Eles tiveram que trocar este hábito para uma vez por semana, porções pequenas, para se adequarem ao padrão mediterrâneo”, aponta a nutricionista Maria Cristina Thomazella.
Para quem precisa cuidar da saúde do coração, trocar a carne vermelha e consumir peixe de três a quatro vezes por semana é fundamental. “Há vários estudos na literatura apontando a associação entre os ácidos graxos ômega 3, um tipo de gordura que tem principalmente nestes tipos de peixes, como o salmão, o atum e a sardinha, que eles conferem um poder antitrombogênico. Ajuda a não entupir as artérias e também tem sido associado um poder antiinflamatório a esses componentes”, diz a pesquisadora .
Três meses depois, o resultado da pesquisa foi considerado um sucesso. “Houve diminuição de peso corporal significativo. Pelo menos parte deste peso corporal que os pacientes perderam foi devido à diminuição de gordura”, aponta a nutricionista.
Os exames de sangue mostraram também que os níveis do colesterol ruim, o LDL, ficaram sob controle nos dois grupos. Outro ponto para a Dieta do Mediterrâneo. Ela deu um empurrãozinho no HDL, a gordura do bem que protege o coração.
“Então, essa melhora do HDL foi indicativa de uma melhora do risco cardiovascular desses pacientes. É interessante que a dieta tem um poder, embora pequeno, mas significativo de aumentar o HDL, lembrando que é muito difícil aumentar o HDL. A dieta conseguiu, pouco, mas conseguiu”, afirma o cardiologista Francisco Rafael Martins Laurindo, do Laboratório de Biologia Vascular do InCor/USP.
A gordura boa também está associada a um dos principais ingredientes da dieta: o azeite de oliva extra-virgem. “É rico em ácidos graxos monoinsaturados. Além disso, ele possui fenóis, que são importantes na proteção cardiovascular também. Mas engorda. Tem que ser em substituição a margarinas, manteigas, cremes vegetais, cremes de leite e passar a ser a gordura predominante naquele hábito alimentar. Aí, sim”, explica a nutricionista Maria Cristina Thomazella.
Mas tem um limite: no máximo duas colheres de sopa no almoço e duas no jantar. Se não der para usar o azeite para cozinhar, os pesquisadores recomendam o óleo de canola.
“O óleo de canola não vai substituir o azeite, mas ele é uma ótima opção de ácidos graxos monoinsaturados para quem não pode estar consumindo o azeite de oliva”, diz a nutricionista.
Mas a grande estrela da dieta do mediterrâneo é sem dúvida o vinho. O paciente precisa ter o consentimento do médico. A dose diária é de 250 mililitros, ou seja, um copo tipo requeijão que pode ser dividido em meio copo no almoço e meio no jantar. Para as mulheres, o indicado é um pouco menos do que isso. Consumido assim, moderadamente, o vinho pode ser o elixir que ajuda o sangue a correr livre.
“O benefício é especialmente anti-agregante plaquetário, ou seja, não formação de ateromas, de placas, auxiliando a não formação dessas placas”, nutricionista. “O vinho também tem os polifenóis, um dos principais é o resveratrol, que tem sido associado muito à proteção cardiovascular nas pesquisas”.
Um efeito inesperado do vinho foi que os voluntários passaram a sentir menos vontade de comer sobremesa. Na Dieta Mediterrânea, doce só de vez em quando e de preferência os de frutas. “O vinho acabava substituindo a vontade do doce e acabava sendo o término da refeição”, diz nutricionista.
“Comer passou a ser prazeroso, quando, para mim, comer estava sendo uma coisa como o remédio que vai me ajudar a superar o problema que eu tive. Eu reencontrei o prazer de comer”, declara Edson.
E quem sabe a dieta mediterrânea não poderá ser agora uma boa opção pra quem precisa fazer essas dietas tão rígidas. “Para falar a verdade, eu sempre gostei de comer. Eu comia de tudo. Para mim, o único prato ruim era o vazio”, conta João.
Fonte: Globo repórter
Fonte: Globo repórter
Nenhum comentário:
Postar um comentário